quinta-feira, outubro 31, 2013

ALEGRIA

Tus cabellos dorados veo yo.
Derramándose escucho tu risa.
Universo de niño evitó
que a mi muerte la viera de prisa.
     
Surgió cerca una estrella después.
Muy cercana y muy lejos estaba.
Agua al yermo sació la avidez
y respuesta en un eco sonaba.
     
Y en un véspero de soledad,
entre la cotidiana gris prosa,
con belleza que es benignidad
floreciste cual pálida rosa.
     
?No es extraño en sollozos romper?
Cada lágrima de hombre es misterio.
Y una gran alegria es tener
un dolor que por breve no es serio.
     
Oigo al pecho infantil palpitar,
veo en rutas de luz sus planetas...
Si los niños que sufren son mar _
no podrán ser felices los poetas.
     
               Pavel MATEV

segunda-feira, outubro 28, 2013

PERSPECTIVA

Estrada a fora, em longa caminhada,
seguíamos a rota do Destino;
sobre a nossa cabeça, o Sol a pino,
jorrava calcinando o pó da estrada;

eu era um devotado peregrino
buscando a perfeição idealizada;
eras a companheira idolatrada
a perfumar o meu sonho divino;

já cansados de andar tanto, entretanto,
a tarde foi caindo mansa, enquanto,

aves brancas, cruzando o azul distante,
se perderam do nosso olhar errante.

E assim, ficamos nós, de olhar vazio,
embebidos no céu... Também vazio !

  
 Andrade Sanches

sábado, outubro 26, 2013

ANSEIO

Há no compasso
Dos teus passos
Essa ternura
Quente, de lã,
Que torna a alma
Duma família,
Serena e calma,
Feliz e sã.
     
E no compasso
Dos meus passos
Apenas traços
Duma infinita
Imperfeição.
     
Sirva a ressalva
Daquela nota
Toda harmonia,
Quase perfeita,
Escrita em carinho,
Em teu louvor,
No pergaminho,
Que não desbota
Nem se amarrota,
Do nosso amor.
     
Sirva a ressalva.
Posso eu dizer
Então:
     
Há no compasso
Dos meus passos
Delével traço
Duma finita
Perfeição.
     
 Manuel Correia Marques

quinta-feira, outubro 24, 2013

ANSEIO

Quero viver isolado,
Que ninguém saiba onde estou,
E, assim, cumprir meu fado
Da hora que já passou.
     
     Viver longe, lá bem longe,
     Onde não saibam que está
     Oh! alguém tornado monge,
     Num viver como não há.
     
Viver, mas sempre cercado
D'amor de quem nos quer bem,
É viver, mas a sonhar,
     
     N'esse sonho de noivado,
     Que do céu nos vem
     Esta vida perfumar.
     
          Martins Junior

quarta-feira, outubro 23, 2013

OVÍDIO, AMORES, I, 5

A tua língua tem a consistência da rosa
e o sabor da madrugada.
Ergo-a com a minha em direcção ao céu
e voas no interior da minha boca.
Mordes os meus lábios
e ficas com a boca entumescida e plena.
Se abres a boca deslizo na tua língua até à garganta:
e sou a loba branca que vem morrer à praia.
     
Percorro o teu ouvido
como o mar explora as grutas;
procuro nele os búzios, as pedras,
as algas da tua história.
     
No meu peito as tuas mãos deslizam
e vêm nele uma superfície castanha,
um velho espelho chinês;
mas no teu peito as minhas mãos suscitam
a escultura e a música:
fazem nascer o volume amigo da terra,
os primeiros cantos da tarde.
Na minha boca ele é manso:
oiço nele a água, a cor do ouro, Henry Moore, o silêncio.
     
A tua pele está agora chegada ao meu rosto
leio nela uma mensagem.
Se sinto nas minhas mãos a curva das tuas coxas,
a grande baía azul do teu ventre descansa;
se me encosto na almofada,
as tuas pernas dobram-se em angulo recto.
As mãos sobem até ao joelho e descem, depois,
até se imobilizarem na grande rosácea aberta do teu ser.
     
A minha mão toma agora a forma da ogiva
e lê nas estalactites aromáticas do teu ser
as inscrições e os símbolos que me transmites.
Repouso com a cabeça entre os teus pés
e aperto nos meus pés a tua cabeça.
Nas tuas mãos sou um unicórnio livre:
elas falam de todo o amor deste mundo
através dos seus cinco sinos.
     
Quando as tuas mãos guiaram o grande chifre fálico
nas espaçosas paisagens do teu ser
os cisnes espalharam-se sobre o lago
batendo com a cauda.
     
                     M. S. Lourenço

terça-feira, outubro 22, 2013

ANSEIO

Subi comigo ao cume de alto monte:
e à proporção que nós formos subindo,
surpreso o nosso olhar vai descobrindo
mais extenso e belíssimo horizonte.

Na encosta um rio tem a sua fonte.
Subindo mais, aldeias vão surgindo.
E ao chegar ao cimo, onde tudo é lindo,
não há beleza que se não aponte.

É mais puro o ar, é mais viva a luz,
tudo nos deslumbra, tudo nos seduz,
envolve a terra um azulino véu.

Assim, os que pelo estudo vão trepando,
novas belezas vão descortinando
no anseio infinito de alcançar o céu.

José Fernando de Moura

segunda-feira, outubro 21, 2013

ORLA MARÍTIMA

O tempo das suaves raparigas
é junto ao mar ao longo da avenida
ao sol dos solitários dias de dezembro.
Tudo ali pára como nas fotografias.
É a tarde de agosto o rio a música o teu rosto
alegre e jovem hoje ainda quando tudo ia mudar.
És tu surges de branco pela rua antigamente
noite iluminada noite de nuvens ó melhor mulher.
(E nos Alpes o cansado humanista canta alegremente)
«Mudança possui tudo»?  Nada muda
nem sequer o cultor dos sistemáticos cuidados
levanta a dobra da tragédia nestas lisas horas.
Deus anda à beira de água calça arregaçada
como um homem se deita como um homem se levanta.
Somos crianças feitas para grandes férias
pássaros pedradas de calor
atiradas ao frio em redor
pássaros compêndios de vida
e morte resumida agasalhada em asas.
Ali fica o retrato destes dias
gestos e pensamentos tudo fixo.
Manhã dos outros não, nossa manhã
pagão solar de uma alegria calma.
Da terra vem a água e da água a alma
o tempo é a maré que leva e traz
o mar às praias onde eternamente somos.
Sabemos agora em que medida merecemos a vida.
     
                       Ruy Belo

sábado, outubro 19, 2013

FLORESTA CONVULSA

Floresta de altas árvores, escuta :
Em minha dor vim conversar contigo,
Como no seio do melhor amigo,
Descanso aqui de tormentosa luta.

Troncos da solidão intacta e bruta,
Sabei... Ah ! que, porém, como um castigo
Vos estorceis, e o som do que vos digo
Vai morrer longe em solitária gruta.

Que tendes, vegetais?... remorso?... crime?...
Açoita-vos o vento, como um bando
De fúrias e anjos maus, que nós não vemos?

Mas explicai-vos ou primeiro ouvi-me,
Que a um tempo assim braceando, assim gritando,
Assim chorando não nos entendemos.

Alberto de Oliveira

sexta-feira, outubro 18, 2013

HORAS MORTAS

O burgo dorme... Só, tristonha e feia,
Anda no ar a sombra, a velha harpia.
E decerto de nada se arreceia,
P'lo modo como tudo encara e espia.

Mas, de repente, vem a lua cheia
Rasgar os véus da noite escura e fria,
E agora cai a jorros nesta aldeia
Luz tão brilhante que parece dia.

Espavorida, a sombra foge, voa
Nem sei p'ra onde. Ao longe ainda soa
O ritmo estrangulado de quem chora...

Depois, como gentis e bons irmãos,
O luar e o silêncio unem as mãos
E vão bailando pela noite fora.

César de Frias

quarta-feira, outubro 16, 2013

ROSA BRANCA

Sonho ou quimera, na ilusão divina
que ao mundo alado o coração transporta,
aquela rosa pálida e franzina
branca e tão branca, parecia morta.

Planta que o frio da existência inclina,
pomba que foge ao seu país... que importa?
Sonho ou quimera, na ilusão divina,
branca, tão branca parecia morta...

Mesmo acordado ou vendo-a com tristeza
nas molduras do sonho e da incerteza,
que a fantasia em pleno azul recorta,

sempre na imensa dor que me fulmina,
aquela rosa pálida e franzina,
branca, tão branca, parecia morta...
António Feijó

sexta-feira, outubro 11, 2013

LA PRISON

Vaste bâtiment, austère et triste,
Que de mystères et secrets se cachent
Derrière tes murs !!

Je dis le mot de passe
Et des grilles m'accueillent,
Tes portes s'ouvrent pour moi,
Pour sur moi se fermer.
Le lourd cadenas, derrière moi,
Est fixé. Son bruit sec
Me fait passer un frisson sur l'échine.
Quel bonheur que je sache
Qu'aprés je sortirai !
     
Me voilà dedans.
Les gardiens, aimables, me saluent
Poliment.
Le Chef, homme du monde, et charmant,
Va faure sa ronde habituelle,
Il me montrera ce qui peut
M'intéresser.
     
Différent des autres, ce "cachot"
Est propre, spacieux, et surtout
Un clame bienfaisant parait y régner.
Ici, aucun donjon,, pas une seule oubliette,
Ni chambre de tortures pour tristes prisonniers.
Quelques grandes salles port petits malfaiteurs,
Plusieurs belles chambres por criminels instruits,
Une petite pharmacie et une infirmerie.
     
La nourriture est simple, mais bonne et nourrissante,
Plisieurs des habitués sont nourris par les siens.
Au fond, c'est un hôtel que les "clients"
Ne doivent quitter et on m'informe
Que souvent même  des condamnés,
A leur libèration, sont désireux
D'y habiter plus longtemps.
     
Des femmes,il y en a peu;
Elles sont en bas, dans une chambre claire,
Et s'occupent de couture.
En haut, une criminelle plus importante
Est seule. Les quelques paroles
Que j'échange avec elle
(Car elle parle l'anglais)
Me font douter
De sa pleine responsabilité.
     
Dans la cour et un peu partout,
Sont postés des soldats indigènes,
Baionette au canon, belles statues de bronze,
Sentinelles impassibles
Que rien n'émouvra.
A l'intérieur, pourtant,
Cinq geôliers au total
Veillent à la sécurité
De duex cents prisonniers.
     
Cette poignée  d'hommes déterminés
Font leur devoir, toujours alertes,
Mais bons, humains et sympathiques.
Admirons-les, saluons-les
Et remercions-les pour leur tâche ingrate.
     
Avec un gros soupir de soulagement
J'écoute, ma visite terminée,
La grande grille se refermer
... derrière  moi !!
     
Et je suis LIBRE !

Robert WENGRAFF    

domingo, outubro 06, 2013

MEMORIA CONSENTIDA

Neste lugar sem tempo nem memória
   nesta luz absoluta ou absurda,
   ou só escuridão total, relances há
   em que creio, ou se me afigura,
   ter tido, alguma vez, passado
   
   com biografia, onde se misturam
   datas, nomes, caras, paisagens
   que, de tão rápidas, me deixam
   apenas a lembrança agoniada
   de não mais poder lembrá-las.
   
   Sobra, por vezes, um estilhaço
   ou fragmento, como o latido
   de um cão na tarde dolente
   e comprida de uma remota infância.
   Ou o indistintio murmúrio de vozes
   
   junto de um rio que, como as vozes,
   não existe já quando para ele
   volvo, surpreso, o olhar cansado.
   Insidiosas, rangem tábuas no soalho,
   ou é o sussurro brando do vento
   
   no zinco ondulado, na fronde umbrosa
   dos eucaliptos de perfil no horizonte,
   com o mar ao fundo. Que soalho,
   de que casa, que vento em que paragens,
   onde o mar ao longe que, entrevistos,
   
   os não vejo já ou, sequer, recordo
   na brevidade do instante cruel ?
   De que sonho, ou vida, ou espaço de outrem
   provêm tais sombras melancólicas,
   ferindo de indecifráveis avisos
   
   este lugar em que, não sendo consentido
   o coração, se não consentem tempo e memória ?
   Pausa ou pena, a seu oculto propósito há-de
   sempre opor-se, lenta, a inexorável asfixia
   desta luz absurda, ou só escuridão total.
   
   Rui Knopfli