segunda-feira, abril 13, 2020

SONHO DESFEITO

Como a nuvem que além, sobre a planura,
Sobe e se esvai no azul da imensidade,
Foi-se o doirado sonho de ventura
Que iluminou a minha mocidade.
     
Sonho que me embalara na doçura
Dum afecto mais puro que a verdade,
E que, nas minhas horas de amargura,
_Era um facho de luz na escuridade !
     
E agora, quanto à mente fatigada
Me acodem, como espectros desolados,
Lembranças de ventura malograda,
     
Bendigo a hora em que a velhice austera
Me há-de imprimir nos lábios descorados,
O sorriso de quem já nada espera...
                 
             Ponta Delgada
             Maria das Mercês do Canto Cardoso 

sábado, abril 11, 2020

CIUMENTA

Fazes-me pena com os teus queixumes,
Minha adorada e encantadora amiga,
E no entanto perdoa que eu te dia
São irrisórios esses teus ciúmes.
    
Eu sou a flor dos solitários cumes
Que a neve queima e o vendaval fustiga,
À qual não chegam mãos de rapariga
Nem desce a protecção dos altos Numes.
    
E tens ciúmes duma pequenita
Em cujos olhos leio a minha sina
E é toda a luz da minha solidão!
    
Porque te assusta o amor que lhe dispenso?
Olha que Deus bondoso e em tudo imenso,
Também me fez imenso o coração.
    
                    Carlos de Moraes

quinta-feira, abril 02, 2020

OS QUE AMEI

O que são hoje? _Esta ansia, esta agonia...
A vê-los sem os ver, a todo o instante,
Junto d'Eles e d'Eles tão distante,
Na dor eterna que p'ara além me guia...
    
São a minha saudade cruciante;
O pensamento meu da cada dia;
O ar que respiro, a luz que me alumia,
Vivos em mim no meu amor constante;
    
São tudo o que me cerca _ em tudo os vejo;
Lembranças que lembrá-las só desejo;
Os ais profundos que a minh'alma solta...
    
Sombras longínquas, pelo céu dispersas...
Mágoas pungentes, no meu peito imersas...
O Bem da minha vida que não volta.
    
        Maria Isabel da Camara Quental