domingo, abril 29, 2007

APARIÇÃO

Vens à tardinha, poisas a meu lado,
E a tua voz murmura como um canto...
Ondeia em névoas de astros o teu manto
É um clarão do Além teu vulto alado!

Ergues nas mãos as rosas do Passado,
que ao seio apertas lacrimosa __ enquanto
elas derramam, húmidas de pranto,
o sangue dum amor crucificado...

Jardim lilás e oiro, a tarde finda,
toda a esfolhar-se em luz crepuscular...
Vens quando é noite já, e dia ainda...

Vens do enigma desta hora enternecida,
quando a tarde é um beijo a soluçar
__um beijo em pranto como a nossa vida!


Bernardo de Passos

CONTRADIÇÃO

Eras criança e via-te crescida,
agora então eu vejo-te criança:
feita de sonho e dor e de esperança,
é uma ilusão sentimental a vida.

Ao vento, à chuva e ao sopro da bonança,
fizemos a jornada na subida...
por mim trilhei a estrada percorrida
com fé e varonil perseverança.

O meu desejo via-te mulher,
antegozando o que vieste a ser:
em nosso lar o astro que mais brilha!

O meu carinho fez-te pequenina:
_meus braços são teu berço de menina,
E assim te chamo tantas vezes filha!

José Trêpa

quinta-feira, abril 26, 2007

IDÍLIO CÓMICO

Aquilo que me lembra com mais gosto
desse cómico amor intermitente,
é uma noite cálida de Agosto
em que ambos nos beijámos longamente,
até luzir no céu a madrugada...
Eu de cá
e tu de lá
_-de uma porta envidraçada...
( Convém explicar talvez
que sucedera um entrave:
A porta estava fechada
e não tínhamos a chave. )

Augusto Gil

ANTONIO ALEIXO

Há luta por mil doutrinas.
Se querem que o mundo ande
façam das mil pequeninas
uma só doutrina grande.

Vós que lá do vosso império
prometeis um mundo novo,
calai-vos que pode o povo
querer um mundo novo a sério.

Contigo em contradição
pode estar um grande amigo;
duvida mais dos que estão
sempre de acordo contigo.

Meu amor, vê se te ajeitas
a usar meias modernas,
daquelas meias que são feitas
da pele das próprias pernas.

Sei que pareço um ladrão ...
Mas há muitos que eu conheço
que, sem parecer o que são,
são aquilo que eu pareço.

Eu já não sei o que faça
p'ra juntar algum dinheiro;
se se vendesse a desgraça
já hoje eu era banqueiro.

Ser artista é ser alguém !
Que bonito é ser artista,
ver as coisas mais além
do que alcança a nossa vista !

António Aleixo
poeta popular

domingo, abril 22, 2007

BÁLSAMO SUPREMO


Como a estrela, a correr no firmamento,
Cai da ilusão em treva convertida,
A esperança, a correr no pensamento,
Se envolve em treva e cai desiludida !...

Então o prazer, soprado pelo vento,
E a ventura em nevoeiro diluída,
Abandona o peito ao sofrimento,
Gravando na memória a dor sofrida.

E a alma anoitece. E quando passa o dia
Logo lhe esquece a luz de uma alegria;
Os anos passam... e não esquece a dor !...

_Mas sempre, a alma, à desventura unida,
A dor ingénita a sofrer na vida,
Por bálsamo supremo __ tem o Amor !

Maria Isabel da Camara Quental

sexta-feira, abril 20, 2007

ADÉLIA

Um viuvo, de extrema fidalguia,
Que sofrera infortúnios conjugais,
Aos seus deuses jurou, por arrelia,
No mesmo meio não casar jamais.

Uma jovem, de extrema mediania,
Que a protecção contava de seus pais,
Inspirando-lhe ardente simpatia,
com ela se ligou por nós fatais.

Bem avisado não será quem siga
Tão vago e temerário proceder;
Este o conselho meu; embora diga,

_Porque a verdade deve-se dizer_
Que essa modesta e pobre rapariga
Parece uma fidalga e sabe-o ser.

Fernandes Costa

quinta-feira, abril 19, 2007

DE VOZ EM VOZ


´Se a língua fizesse as pátrias
Mais que o chão, ninguém diria
Onde Portugal acaba,
Onde o Brasil principia.

Se os passarinhos dissessem
Quanto guardam na memória...
Talvez saibam, mais que as gentes,
As geografias e a história !

Esta manhã acordei
Ao canto dum 'Bem-te-vi':
__«Se pudesse, eu mandaria
Vir Portugal para aqui !»

Ao cimo da verde palma,
Respondeu-lhe o 'Sabiá':
__«Pudesse eu, e mandaria
Ir o Brasil até lá !»

__«Não fosse eu tão pequenino,
Deu sentença o 'Beija-flor'
E do mar faria um lago
Com dois jardins ao redor...

Na fala de Bernardim,
O Brasil a arder em trovas...
__Ó cerejeira velhinha,
Cheia de cerejas novas !

António Corrêa D'Oliveira

terça-feira, abril 17, 2007

Versos a PORTUGAL

Pátria distante ! Doce PORTUGAL !
Régio lírio do Douro, flor do Tejo !
Pátria, mãe de outra Pátria tua igual,
Eis porque, por querer-te, não te invejo.

És tu abençoada, terra amiga !
Nobre terra dos bravos lusitanos !
Teu poder é tão forte que te obriga
Ao desafio intérmino dos anos.

E prossegues mais bela, mais fidalga,
No teu clássico lustre, e teu fulgor;
Antiga castelã que ainda cavalga
Entre brasões de original lavor.

Em palácios de luxo, medievais,
Na arquitectura de feições severas
Fulge, na alma de luz dos seus metais,
A alma de seus artistas de outras eras.

Teus chafarizes, tuas velhas vilas,
Sobre o fundo gracioso de olivais,
São as relíquias simples e tranquilas
Dos teus nobres saudosos ancestrais.

Amo o calor das noites portuguesas
Quando as guitarras dão cadência aos fados ...
Amo a graça dos típicos bailados
Das formosas e ingénuas camponesas.

Amo-te assim, por teu luar de prata,
Por tuas caravelas, pelos mares,
Pelo teu cristianismo aristocrata
Que em plena selva fez erguer altares...

Amo-te mais, ó PORTUGAL antigo !
Ó doce PORTUGAL do mundo novo !
Pela herança que deste ao povo amigo,
Pela imensa saudade do meu povo.


Belo Horizonte__Minas gerais__BRASIL
Mercês Maria Moreira (brasileira)


http://www.caetanopolis.hpg.ig.com.br/filhos.htm

segunda-feira, abril 16, 2007

GENTE PORTUGUESA

Costa de Portugal, costa formosa
Que o mar fremente vem orlar de espuma;
Largo horizonte, em que através da bruma
Surge sempre uma vela aventurosa!...

O Mar, eterno mote, eterna glosa
Que as gerações nos cantam, uma a uma,
Em voz que algumas vezes se avoluma
Num grito de epopeia gloriosa!

Gente de Portugal! O vosso olhar
Nunca sonhou, nem quis outra beleza,
Foi esta sempre que julgou sem par!...

Mais do que a terra, mais do que a riqueza,
É o Mar infinito, é sempre o Mar
O grande amor da gente poruguesa!...

Maria de Carvalho

quinta-feira, abril 12, 2007

CIGARRA MESTRA

As cigarras cantavam nesse dia:
Dir-se-ia ser o sol que as inspirava...
Uma delas, porém, já não vivia
Mas desse musical participava!

__«As formigas levavam-na, chovia...»
No «Enterro da Cigarra» ele contava,
E hoje, que este sol resplandescia,
O coro das cigarras o exaltava.

Quando uma cigarra falta, outra aparece
A cantar em seu ritmo cigano
A beleza do céu que não fenece.

E o fim da formiga? Ignoto, insano,
Enquanto que a cigarra bem merece
A glória de um Olegário Mariano!

Milton F. Mendes

domingo, abril 08, 2007

O ENTÊRRO DA CIGARRA


As formigas levavam-na... Chovia...
Era o fim... Triste Outono fumarento !...
Perto, uma fonte, em suave movimento,
Cantigas de água trémula carpia.

Quando eu a conheci, ela trazia
Na voz um triste e doloroso acento.
Era a cigarra de maior talento,
Mais cantadeira desta freguesia.

Passa o cortejo entre árvores amigas...
Que tristeza nas folhas... que tristeza !
Que alegria nos olhos das formigas !...

Pobre cigarra ! quando te levavam,
Enquanto te chorava a Natureza,
Tuas irmãs e tua mãe cantavam...

Olegário Mariano

sexta-feira, abril 06, 2007

JOÃO DE DEUS


ADORAÇÃO

Vi o teu rosto lindo,
Esse rosto sem par;
Contemplei-o de longe mudo e quedo,
Como quem volta do áspero degrêdo,
E vê ao ar subindo
O fumo do seu lar!

Vi esse olhar tocante,
De um fluido sem igual;
Suave como lâmpada sagrada.
Benvindo como a luz da madrugada
Que rompe ao navegante
Depois do temporal!

Vi esse corpo de ave,
Que parece que vai
Levado como o Sol ou como a Lua
Sem encontrar beleza igual à sua;
Magestoso e suave,
Que surpreende e atrai!

Atrai e não me atrevo
A contemplá-lo bem;
Porque espalha o teu rosto uma luz santa,
Uma luz que me prende e que me encanta
Naquele santo enlevo
De um filho em sua mãe!

Tremo apenas pressinto
A tua aparição,
E só se me aproximasse mais, bastava
Pôr os olhos nos teus, ajoelhava!
Não é amor o que eu sinto,
É uma adoração!

Que as asas providentes
Do anjo tutelar
Te abriguem sempre à sua sombra pura!
A mim basta-me só esta ventura
De ver que me consentes
Olhar de longe... olhar!


João de Deus

O ROUXINOL E OS SEUS ESPECTADORES

Em claro dia de Junho,
Numa floresta sombria,
Aprazível rouxinol
Pasmosas canções tecia:

Ora os suave gorgeios
Por modos mil variando,
Ora os sons afectuosos
Com raro esmero trinando.

Ás vezes baixinho ensaia
Ternas cadências mimosas,
Às vezes despede afoito
Volatas prodigiosas.

Pintassilgo atento e dócil
Com que transportes o admira!
Nem sequer um som lhe escapa,
A medo geme e respira.

Que doce prazer se esparge
Na odorífera espessura!
Como se enche a natureza
De harmonia e de ternura!

Mas, enquanto o meigo assombro
A todo o momento cresce,
Tôsco, insensível jumento
Espreguiça-se, adormece:

E monótona cigarra,
Tão néscia quanto orgulhosa,
Retinindo, desentranha
Cantiga fastidiosa.

Que vale o mérito insigne
Aos olhos do vulgo abjecto ?
Só quem tem uma alma nobre
Aprecia um nobre objecto.

J. V. Pimentel Maldonado

quarta-feira, abril 04, 2007

VOZ DO POVO

A todos os visitantes deste blogue desejo uma Páscoa muito feliz.
Convém salientar que vivo num país de tradição católico 'PORTUGAL' (as práticas já me deixam dúvidas), daí a razão dos meus votos de BOA PÁSCOA (estou inserido no contexto).

Ninguém diga neste mundo:
desta água não beberei.
Ninguém diga o que não sabe,
nem afirme o que não viu.
Ninguém sabe o bem que perde,
senão depois de perdido.