sexta-feira, fevereiro 29, 2008

NOIVADO ESTRANHO

Quisera amar-te muito, ó Gémea do Luar,
Num sonho excepcional, só de carícias feito,
Abendiçoar o céu na luz do teu olhar,
E a alma adormecer na curva do teu peito;

Quisera amar-te sempre, ó Doce como arminho
E casta como a pomba em seus arrulhos doces...
E, em troca deste amor, viver do teu carinho,
Que eu não vivia, não, Mulher, se tu não fosses!

Passar a vida inteira a ver-me nos teus olhos,
Apenas ter ventura em vez de ter abrolhos,
Beber o teu sorriso, e as mágoas esquecê-las...

E quando a morte viesse e nos levasse a ambos
Realizarmos então os desejados tambos,
Na igreja do Além... em meio das estrelas.

José Duro


segunda-feira, fevereiro 25, 2008

ANTÓNIO FEIJÓ

A UMA MULHER FORMOSA
Nas límpidas canções que me inspiraste
ao som da flauta d'ebano cantadas,
narrava as minhas mágoas desoladas,
mas tu não me escutaste!

Depois compus estâncias primorosas,
que lêste em carinho e sem ternura,
lançando ao rio as páginas formosas
onde eu cantava a tua formosura.

Quis ser então mais fino e mais amável:
dei-te um presente fabuloso e raro,
uma enorme safira comparável
a um céu nocturno imensamente claro.

E em paga d'essa joia deslumbrante,
d'esse primor, d'uma riqueza louca,
mostraste-me, sorrindo um só instante,
as pequeninas pérolas da boca.

António Feijó

http://pt.wikipedia.org/wiki/António_Feijó

sexta-feira, fevereiro 22, 2008

MÃOS DE MULHER

Mãos de mulher! Oh! doces mãos piedosas
Semeando o bem a todos os instantes;
Mãos de mães, de irmãs, ou mãos de amantes
Erguendo-se em preces silenciosas.

Mãos que têm perfurme a nardo e rosas!
Se são de amor seus gestos perturbantes,
Tecem rendas, brocados rutilantes,
Refúgio amigo em horas dolorosas.

Mãos que embalam o filho no regaço.
Trazendo o mundo em jeito d'um abraço...
Tão leves, tão macias elas são...

Mãos velhinhas, de dedos já sem vida,
Resignadas esperam a partida
Desfiando o rosário em oração.

Maria de Lourdes Lima

quinta-feira, fevereiro 14, 2008

FEDERICO GARCIA LORCA

LA MONJA GITANA

SILÊNCIO de cal y mirto.
Malvas en las hierbas finas.
La monja borda alhelíes
sobre una tela pajiza.
Vuelan en la araña gris
siete pájaros del prisma.
La iglesia gruñe a los lejos
como un oso panza arriba.
!Qué bien borda! !Con qué gracia!
Sobre la tela pajiza
ella quisiera bordar
flores de su fantasia.
!Qué girasol! !Qué magnolia
de lentejuelas y cintas!
!Qué azafranes y qué lunas
en el mantel de la misa!
Cinco toronjas se endulzan
en la cercana cocina.
Las cinco llagas de Cristo
cortadas en Almería.
Por los ojos de la monja
galopan dos caballistas.
Un rumor último y sordo
le despega la camisa,
y, al mirar nubes y montes
en las yertas lejanías,
se quiebra su corazón
de azúcar y yerbaluisa.
!Qué, qué llanura empinada
con veinte soles arriba!
!Qué rios puestos de pie
vislumbra su fantasia!
Pero sigue con sus flores,
mientras que de pie, en la brisa,
la luz juega el ajedrez
alto de la celosía.

Federico García Lorca

http://pt.wikipedia.org/wiki/Federico_Garc%C3%ADa_Lorca

segunda-feira, fevereiro 04, 2008

DÚVIDA

Felizes os que vivem sem pensar
E acreditam em tudo, simplesmente;
Feliz também aquele que descrente,
Julga a verdade em tudo renegar.

Só eu jamais na vida hei-de encontrar
A certeza em que vive muita gente...
Busco a verdade, infatigàvelmente,
Mas nenhuma me pode contentar.

E tudo me parece falso e vão,
E chego a não saber qual a razão,
Pois a nenhuma ideia fico presa...

Triste de quem não sabe nada ao certo
E tem, como resposta no deserto,
Apenas esta angústia da Incerteza.

Hanid Estela