BALADA DO DOMINGO TRISTE
Chove.
A tarde doente vem dizer-me
Das suas queixas e das suas dores.
Os móveis e os seres inanimados
São testemunhas.
Também sobre eles cai,
Trazida pela luz desta tarde sombria,
A tristeza das vidas sem destino.
Mas não n'a sentem
E é bem melhor para eles.
Abrem-se as portas do palácio negro
Que existe dentro de mim.
Luzes vermelhas
Soltam-se no ar,
Mas, ao chegar ao negro das paredes
Logo se apagam.
Vitrais alacres tingem sóis doirados,
Riscos de cor alagam os tapetes,
Mas tudo se desfaz.
E o meu leito
_ A única brancura
Que se distingue nesse inferno escuro _
Roça carícias na minha alma doente.
E tudo morre, quando entra em mim.
A maldição destas paredes negras
Semeia esquifes no lagedo frio.
Há ilusões emparedadas vivas...
Dos visitantes, um enlouqueceu:
Foi o Amor.
Canta, por noites longas de arrepios,
canções estrídulas,
Dissonantes, álgidas.
Outro, o Desejo,
Corre, alucinado,
Lançando-se aos vitrais,
Despedaçando as carnes pelas grades.
Quer ir tocar as formas
Das nuvens sensuais;
Aspirar os perfumes
Da luz que aqui não vive.
Quer morder rochas
Lívidas, abruptas,
Até sentir o sangue
(a espuma dos rochedos)
A escorrer-lhe pelas faces,
Das chagas de oiro e sal.
Sentamo-nos à mesa.
Um alto candelabro
Que ilumina todos,
Dá ao grupo o aspecto
Dum sonho de escultor.
Parecemos perdidos na Sala do Infinito.
Eu presido ao banquete.
As iguarias vêm,
E os meus Instintos,
E os meus Defeitos e Virtudes,
E a legião faminta dos meus hóspedes
Começa a devorar
O meu corpo transido.
E o festim continua...
No candelabro as velas vão morrendo.
Senhor, se até a Fé me abandonar
E a Esperança me não der
Mais uma esperança _
O que será de mim ?!
Fazei que, ao menos, eu não entre mais
Neste palacio de paredes negras.
Prefiro abandonar o meu país
_ O Pensamento
E ver apenas o que o meu corpo vê.
Não recordar nem saber o caminho
Deste palácio
Onde me mora a alma.
Chove.
As coisas físicas ficaram
Na serenidade, apáticas,
Indifirentes.
Também eu queria ser
Apenas um objecto inanimado;
Assim como o cinzeiro
Aonde apago
O meu cigarro !
Barro vidrado
Todo branco e azul,
Com o desenho duma caravela,
E as velas sujas
De cinza morta.
Sem bandeira no mastro,
Sem um porto à demanda...
Cai a chuva lá fora
E ele não sente.
Cai chuva,
Mas
Não é chuva:
São os meus gritos
Que andam pelo ar
E caem transformados
Em tempestades
De lágrimas geladas.
Sou eu pulverizado
Em cinzas líquidas,
Fagulhas de incêndio
Que anda em mim.
Sou eu universal,
Em labaredas
Num fogo frio
De ventos a atear.
Chove...
Não, não está a cair chuva.
Sou eu,
Que estou a chorar.
Carlos Santelmo
A tarde doente vem dizer-me
Das suas queixas e das suas dores.
Os móveis e os seres inanimados
São testemunhas.
Também sobre eles cai,
Trazida pela luz desta tarde sombria,
A tristeza das vidas sem destino.
Mas não n'a sentem
E é bem melhor para eles.
Abrem-se as portas do palácio negro
Que existe dentro de mim.
Luzes vermelhas
Soltam-se no ar,
Mas, ao chegar ao negro das paredes
Logo se apagam.
Vitrais alacres tingem sóis doirados,
Riscos de cor alagam os tapetes,
Mas tudo se desfaz.
E o meu leito
_ A única brancura
Que se distingue nesse inferno escuro _
Roça carícias na minha alma doente.
E tudo morre, quando entra em mim.
A maldição destas paredes negras
Semeia esquifes no lagedo frio.
Há ilusões emparedadas vivas...
Dos visitantes, um enlouqueceu:
Foi o Amor.
Canta, por noites longas de arrepios,
canções estrídulas,
Dissonantes, álgidas.
Outro, o Desejo,
Corre, alucinado,
Lançando-se aos vitrais,
Despedaçando as carnes pelas grades.
Quer ir tocar as formas
Das nuvens sensuais;
Aspirar os perfumes
Da luz que aqui não vive.
Quer morder rochas
Lívidas, abruptas,
Até sentir o sangue
(a espuma dos rochedos)
A escorrer-lhe pelas faces,
Das chagas de oiro e sal.
Sentamo-nos à mesa.
Um alto candelabro
Que ilumina todos,
Dá ao grupo o aspecto
Dum sonho de escultor.
Parecemos perdidos na Sala do Infinito.
Eu presido ao banquete.
As iguarias vêm,
E os meus Instintos,
E os meus Defeitos e Virtudes,
E a legião faminta dos meus hóspedes
Começa a devorar
O meu corpo transido.
E o festim continua...
No candelabro as velas vão morrendo.
Senhor, se até a Fé me abandonar
E a Esperança me não der
Mais uma esperança _
O que será de mim ?!
Fazei que, ao menos, eu não entre mais
Neste palacio de paredes negras.
Prefiro abandonar o meu país
_ O Pensamento
E ver apenas o que o meu corpo vê.
Não recordar nem saber o caminho
Deste palácio
Onde me mora a alma.
Chove.
As coisas físicas ficaram
Na serenidade, apáticas,
Indifirentes.
Também eu queria ser
Apenas um objecto inanimado;
Assim como o cinzeiro
Aonde apago
O meu cigarro !
Barro vidrado
Todo branco e azul,
Com o desenho duma caravela,
E as velas sujas
De cinza morta.
Sem bandeira no mastro,
Sem um porto à demanda...
Cai a chuva lá fora
E ele não sente.
Cai chuva,
Mas
Não é chuva:
São os meus gritos
Que andam pelo ar
E caem transformados
Em tempestades
De lágrimas geladas.
Sou eu pulverizado
Em cinzas líquidas,
Fagulhas de incêndio
Que anda em mim.
Sou eu universal,
Em labaredas
Num fogo frio
De ventos a atear.
Chove...
Não, não está a cair chuva.
Sou eu,
Que estou a chorar.
Carlos Santelmo