Antonio Duarte GOMES LEAL
DE NOITE
Ele vinha da neve, dos trabalhos
violentos, custosos, da enxada,
cantando a meia voz, pelos atalhos.
A mulher, loura, infeliz, resignada,
cosia junto à luz. O rijo vento
batia contra a porta mal fechada.
Ao pé, havia um Cristo, um ramo bento
e uma estampa a Virgem, colorida,
cheia de mágoa, olhando o firmamento...
Uma banca de pinho, mal sustida,
vacilante aos pés: um candeeiro,
companheiros daquela negra vida.
O homem, alto, pálido, trigueiro,
entrou. Tinha as feições queimadas, duras,
dos que andam com a enxada, o dia inteiro.
A mulher abraçou-o. As linhas puras
do seu rosto contavam já tristezas
de grandes e secretas amarguras.
Tinha chorado muito as estreitezas
daquela vida assim!... Talvez sonhado
um dia com palácios e riquezas!
Ele deitou-se a um canto, fatigado
de erguer-se, alta manhã, todos os dias,
mal voavam as pombas do telhado.
Lá fora, nuvens grossas e sombrias
no pesado horizonte. Ele assim esteve
__ as noites eram ásperas e frias __.
Ela cobriu-o duma manta leve,
esburacada, velha. No telhado
ouvia-se cair, sonora, a neve.
Ela então meditou no seu passado;
no seu primeiro beijo, nas lembranças,
talvez, do seu vestido de noivado,
e nas tardes das eiras, e das danças
às estrelas, e aquela vez primeira
que a rosa lhe furtou das longas tranças;
e aquela tarde, junto da amoreira,
que trocaram as mãos; e na janela;
e quando olhavam juntos; a ribeira;
e quando era tímida e singela...
................................................................
Lá fora, dava o vento nos caixilhos;
não brilhava no céu nem uma estrela.
E, àquela hora da noite, por que trilhos
andariam no mundo __ ela cismava __
nas misérias, talvez, sem rumo, os filhos!...
Ele, na manta velha, ressonava.
Gomes Leal
(1848-1921)
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_Gomes_Leal
Ele vinha da neve, dos trabalhos
violentos, custosos, da enxada,
cantando a meia voz, pelos atalhos.
A mulher, loura, infeliz, resignada,
cosia junto à luz. O rijo vento
batia contra a porta mal fechada.
Ao pé, havia um Cristo, um ramo bento
e uma estampa a Virgem, colorida,
cheia de mágoa, olhando o firmamento...
Uma banca de pinho, mal sustida,
vacilante aos pés: um candeeiro,
companheiros daquela negra vida.
O homem, alto, pálido, trigueiro,
entrou. Tinha as feições queimadas, duras,
dos que andam com a enxada, o dia inteiro.
A mulher abraçou-o. As linhas puras
do seu rosto contavam já tristezas
de grandes e secretas amarguras.
Tinha chorado muito as estreitezas
daquela vida assim!... Talvez sonhado
um dia com palácios e riquezas!
Ele deitou-se a um canto, fatigado
de erguer-se, alta manhã, todos os dias,
mal voavam as pombas do telhado.
Lá fora, nuvens grossas e sombrias
no pesado horizonte. Ele assim esteve
__ as noites eram ásperas e frias __.
Ela cobriu-o duma manta leve,
esburacada, velha. No telhado
ouvia-se cair, sonora, a neve.
Ela então meditou no seu passado;
no seu primeiro beijo, nas lembranças,
talvez, do seu vestido de noivado,
e nas tardes das eiras, e das danças
às estrelas, e aquela vez primeira
que a rosa lhe furtou das longas tranças;
e aquela tarde, junto da amoreira,
que trocaram as mãos; e na janela;
e quando olhavam juntos; a ribeira;
e quando era tímida e singela...
................................................................
Lá fora, dava o vento nos caixilhos;
não brilhava no céu nem uma estrela.
E, àquela hora da noite, por que trilhos
andariam no mundo __ ela cismava __
nas misérias, talvez, sem rumo, os filhos!...
Ele, na manta velha, ressonava.
Gomes Leal
(1848-1921)
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_Gomes_Leal
11 Comments:
Versos tristes, amargurados, que tanta gente deve sentir na pele.
Quantos sonhos perdem-se nas amarguras!
Quanto tempo não venho te ver, Manu.
Desculpe, mas nem sempre dá
Fica um beijinho pra ti
Um retrato escrito...
Triste... mas a vida não é só riso.
E de dia a vida assim continuava
magoada...pobre e habituada
só o sol, a luz lhe emprestava...
histórias de vidas sofridas
escritas por poetas de almas sentidas!
Rico em rima :) poético, mas bem triste...a pobreza que de várias formas, ainda existe...
Beijinhos
Siempre podemos transformar nuestros Momentos !!!!
Gracias por hacer tuyo mi Blog....
Surpreendida De Propósito!...
Venho agradecer a sorrir a visita ao meu cantinho.
Um abraço
SENSIBILIDAD.
BESOS PARA TI.
MAR
Linda poesia, lindinho! Uma história de vida, triste, mas contada com a maestria do poeta...
Bom fim de semana!
Beijos
Una historia triste que lamentablemente se repite en muchos hogares , la mujer siempre luchadora que deja sus sueños en pos de los que ama y disfraza su pena tras una sonrisa.
Un abrazo grandote y gracias por tu visita :)
Um pouco tristonho, mas tudo isso passa.
Beijinhos!
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